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O que é e para que serve o corte etário

É polêmica a legislação que estabelece a idade de ingresso no Ensino Fundamental, mas respeitar a maturidade da criança é importante

Um assunto que provoca muitas discussões e dúvidas entre pais e profissionais da educação é a questão do corte etário para o ingresso na Educação Infantil e no Ensino Fundamental. As leis 12.796/13 e 11.274/06 estabelecem, respectivamente, que as crianças ingressem com quatro anos na Educação Infantil e seis anos no Ensino Fundamental. Além disso, as Resoluções de número 1/2010 e 225/2011, dos Conselhos Nacional e Estadual de Educação, respectivamente, orientam que as escolas matriculem no 1º ano do Ensino Fundamental apenas os alunos que completarem seis anos de idade até o dia 31 de março do ano em que ocorrer a matrícula.

A princípio todas as escolas públicas (estaduais ou municipais) e as privadas de todos os estados brasileiros estão submetidas à legislação educacional. No entanto, o estado de São Paulo fixa a data de corte em 30/06, por intermédio de sua Deliberação CEE 73/2008 e o estado do Rio de Janeiro possui uma Lei Estadual de N.5844/2009 que fixa a data de corte em 31/12.

Mas a Justiça da Educação de algumas capitais alerta para a ilegalidade dessas leis, pois nem a Constituição Federal, nem a Lei nº9.394/96 (Lei de Diretrizes e Bases da Educação, LDB) estabelecem idade mínima para o ingresso no Ensino Fundamental, ou seja, as crianças que completam seis anos de idade durante o período letivo têm direito a serem matriculadas no 1º ano do Ensino Fundamental, sem qualquer limitação. Porém, a matrícula delas deve ser efetivada mediante a adoção de medidas especiais de acompanhamento e avaliação do seu desenvolvimento global e, não apenas de um critério etário.

Com todas essas leis, resoluções e deliberações é possível imaginar como as escolas e, principalmente, as famílias ficam confusas na hora de realizar as matrículas. Isso porque, sem fiscalização adequada, cada escola escolhe, de acordo com sua dinâmica de trabalho, a idade de corte que mais lhe convém. E isso causa sérios problemas para as famílias, principalmente, quando as crianças precisam mudar de escola. Muitas vezes a diferença de idade é de apenas alguns meses e, ainda assim, a escola não aceita matricular a criança no 1° ano, alegando que se a criança tem cinco anos deveria estar na Educação Infantil. Por outro lado, pais ansiosos argumentam que o filho está apto a ler e a escrever e por isso deveria frequentar o Ensino Fundamental.

Educadores afirmam que é preciso entender que a questão da idade aqui não está relacionada apenas à questão de tempo, ou seja, idade e tempo não são sinônimos; portanto, não podemos considerar que esse seja um fator de discriminação, mas uma possibilidade de respeitar as crianças em suas especificidades. É importante pensar na idade como um conceito que traz em sua essência referências ao desenvolvimento humano em suas várias características.

A limitação de idade tem vinculação direta com o processo de maturação da criança. Como sabemos, o crescimento ocorre em uma série de estágios que estão relacionados à idade. Cada estágio produz mudanças significativas na habilidade intelectual, nos vínculos emocionais e nas relações sociais. Além disso, é importante refletir sobre as diferenças entre a Educação Infantil e o Ensino Fundamental. Já vimos em outro artigo que estas são etapas completamente diferentes, com objetivos específicos e rotinas próprias. Por isso, mesmo reconhecendo que cada criança tem seu ritmo e, portanto, desenvolve-se ao seu tempo, não podemos negar que a Educação Infantil é a etapa mais preparada pedagogicamente para receber a criança de cinco anos.

Nossa sociedade valoriza cada vez mais a competitividade e o que se vê é uma aceleração desenfreada do “crescimento” infantil em detrimento do desenvolvimento global da criança. Na maioria das vezes, quando as famílias são orientadas a deixar a criança na Educação Infantil, o que as impedem de seguir tal orientação é a falsa ideia de que a criança ficará atrasada em relação às demais, principalmente dos amiguinhos próximos e familiares (primos ou irmãos mais velhos). Com isso, decidem matricular a criança no 1° ano, mesmo que esta tenha menos de seis anos.

Quem realmente ganha com essa aceleração?! Com certeza, não é a criança, pois o que vemos atualmente é que a infância vem sendo cada vez mais encurtada, e escolas de Ensino Fundamental, sendo obrigadas a receber crianças cada vez mais imaturas e, principalmente, inseguras. Precisamos modificar o nosso olhar e movê-lo em direção à compreensão da infância como fase única da vida. O professor David Elkind em seu livro “Sem tempo para ser criança” afirma, entre outras coisas, que quando as crianças são pressionadas a crescer depressa, aquisições importantes são omitidas ou desviadas, o que pode provocar sérios problemas mais tarde. E finaliza enfatizando que não importa que filosofia de vida abracemos, é importante encarar a infância como um estágio da vida, não simplesmente como a antessala da vida. Uma filosofia de vida é essencialmente uma maneira de enxergar nossas vidas em perspectiva e de reconhecer as necessidades e os direitos dos outros. Se conseguirmos descentralizar, poderemos começar a apreciar o valor da infância com suas próprias alegrias, tristezas, preocupações e recompensas.

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