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Infância e consumo

A felicidade e a formação da criança não deve estar relacionada a bens materiais

É praticamente impossível falar em crianças sem falar em adultos, pois a concepção de criança que temos hoje, e a que tínhamos há algum tempo, é vivida e apreendida a partir das construções feitas pelos adultos. Sejam pais, familiares, professores, médicos ou qualquer outro profissional, todos, de alguma forma, são porta-vozes dessa construção.

As visões sobre a infância, as formas de ver e lidar com as crianças são constituídas social e historicamente. Sendo assim, é possível perceber que a criança é vista de forma muito diversificada ao longo dos tempos. Em cada um dos momentos da história, a sociedade, a cultura e a política determinaram os tipos de visões sobre a infância e, também, sobre a família.

Estudos nos revelam que na Idade Média o sentimento de infância, simplesmente, não existia. Não havia consciência da particularidade infantil. Em contrapartida, na Idade Moderna a criança é vista como um indivíduo que precisa de atenção especial. Apenas na Idade Contemporânea, período atual da história, é que a criança adquire direitos e passa a ser vista como sujeito histórico, social e cultural. Se antes as crianças não ocupavam um lugar definido, viviam “misturadas” com os adultos e eram vistas como adultos em miniaturas, hoje elas ocupam um lugar central na nossa sociedade. Mas que lugar é esse?

Em busca de uma vida melhor e mais confortável, as pessoas passam cada vez mais tempo fora de casa trabalhando. Atualmente, homens e mulheres trabalham por igual período, chegando a uma jornada de até doze horas por dia. Além disso, a estrutura familiar se modificou e essa dinâmica, muitas vezes, contribui para que as crianças fiquem “sós”. A criança sozinha fica vulnerável e se torna alvo fácil do consumo. Muitos fatores colaboram para que isso aconteça. O primeiro exemplo vem de casa, pois o comportamento dos pais, sem dúvida, exerce extrema influencia. A escola, por sua vez, seria grande aliada se não reproduzisse a sociedade em suas regras de convivência. A mídia e a publicidade são outros fatores de grande influência no ato de consumir. Datas comemorativas como o Natal e o Dia das Crianças são ótimas oportunidades para bombardear as crianças com uma publicidade abusiva e exaustiva.

De maneira desenfreada, nossa sociedade se transforma na sociedade do consumo. Refiro-me a um consumo desnecessário, à ideia de que é preciso ter muitos bens materiais para ser alguém admirado e respeitado.  A sensação é que hoje em dia as pessoas não se relacionam mais por interesses emocionais ou identificação afetiva. Atualmente, as relações são pautadas no âmbito material. A necessidade de pertencer a um grupo leva as pessoas a adquirir objetos ou a fazer passeios para sentirem-se incluídas.

Se os adultos se relacionam dessa forma, com as crianças não haveria de ser diferente. Brinquedos, roupas, calçados, viagens… Tudo isso se transforma em um passaporte para a “amizade”, para a “popularidade”. Autores afirmam que objetos e coisas são, com frequência, utilizados para demarcar relações sociais, estilos de vida, hábitos e preferências entre as pessoas. As relações entre crianças, e também entre os adultos e as crianças, são demarcadas pela “cultura das coisas”, ou seja, pelos bens materiais e simbólicos que circulam entre nós, originando noções de bem-estar, felicidade, prazer e, também, o seu oposto, a infelicidade e o desprazer.

O consumo desenfreado tomou conta da nossa sociedade e o seu alvo principal são as crianças. Isso porque o poder de decisão que elas exercem sobre os pais é imenso.É  necessário perceber e respeitar a criança em todas as suas particularidades, seu modo de pensar, criar, agir e brincar, mas não podemos e não devemos nos tornar reféns dos seus desejos.  Não há receita para mudar essa realidade, mas um bom começo seria os pais valorizarem mais a companhia dos filhos. Ouvi-los, brincar com eles, conversar, contar uma história. Além disso, fazer doações de roupas e brinquedos também pode ser uma ótima alternativa. Se isso não resolve o problema pelo menos melhora a qualidade dessa relação. É importante que as pessoas encontrem novas formas de preencher a si mesmas que não seja através de bens materiais. Vamos nos preencher de gentileza, solidariedade e amor ao próximo! A infância é um período importante para a formação do indivíduo e as experiências vividas nessa fase são a base para a construção da personalidade adulta.

 

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