“A mãe possível que sou se reencontra com a que fantasiava ser”
“Não sou exatamente de textão. Apesar do meu popular excesso de romantismo e chororô em quase tudo. Hoje, seis anos depois da revolução maior que a vida me ofereceu até aqui, me deu muita vontade de ser só realista. E de dividir uma lacuna inexplicável que me tomou e quase me nocauteou, na hora que deveria ter sido, segundo todos os catálogos de vida plena, o momento sublime, o clímax de tudo. Queria falar do que não é perfeito, do que é também muito humano. E vira uma dor maior porque não costuma ser dividida. Que é silenciosa. E acima de tudo envergonhada. Eu amo minhas meninas acima e além de todo amor reunido que já senti na vida. Mas sei o que foi estar ausente de mim o suficiente para ver o medo ter sido maior do que esse infinito que vejo hoje sólido, construído, repactuado todo dia. Não veio no primeiro olhar. Dormia em algum lugar entre meu leito de mãe apática e as caixinhas da UTI pra onde elas foram levadas. Me faltaram hormônios, me faltou sono. E eu cheguei a achar que me faltou amor. Doze dias sem piscar o olho, sem bocejar. Refém de um total desconhecimento emocional de mim mesma. Mas veio minha mãe, me amando em sopinhas, cafunés, histórias, disponibilidade. Minhas irmãs, se doando. E o Marcelo, que as amou linda e romanticamente ao primeiríssimo olhar. E soube ver em mim o que nem eu via. Procuramos ajuda. Recebi ajuda. Essencial. Química. Mas também emocional. Não existe uma mãe igual a outra. Uma história que se repita. A minha tem sido essa. E quis dividir agora porque essa é a sensação real que tenho: já quis me absolver da tal lacuna. Não mais. A mãe possível que sou se reencontra com a que fantasiava ser. Por tudo, apesar de tudo e sobretudo: viver é mesmo tão melhor que sonhar”.
Maiá Menezes é jornalista e mãe das gêmeas Luana e Marina.
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