Aedes aegypti, Zika, microcefalia. Especialistas falam de prevenção e riscos da doença
A microcefalia é hoje uma das grandes preocupações das gestantes. E não é para menos. O risco de malformação congênita do cérebro do bebê sempre existiu, mas o aumento dos registros tem sido relacionado ao surto de Zika. O Ministério da Saúde já confirmou 907 casos de microcefalia (122 com resultado positivo para o Zika), e investiga 4.293 casos suspeitos. Ainda há muitas dúvidas sobre o assunto, e é justamente a falta de certeza sobre de que maneira o vírus ataca o feto e de que forma isso pode ser evitado, que preocupa também a comunidade médica.
O infectologista Ralcyon Azevedo Teixeira, membro da Sociedade Brasileira de Infectologia (SBI), ressalta a importância da prevenção.
– Ainda são aguardados maiores estudos para tentar compreender como e de que maneira a infecção por Zika vírus acaba atacando o feto e causando malformação. A prevenção ainda é bem importante. Todos devem fazer o rastreamento e combate de focos do mosquito Aedes aegypti nas suas casas e na vizinhança e se proteger sempre – afirma o médico.
No caso das grávidas, o cuidado deve ser redobrado. E isso, durante toda a gestação.
– Ainda não conhecemos totalmente o vírus da Zika e as doenças por ele causadas. Nesse sentido, não podemos afirmar que a microcefalia só se desenvolve em determinada fase da gestação. Baseado nos casos relatados até o momento e considerando o comportamento de outros agentes infecciosos que também comprometem o desenvolvimento fetal, é provável que o impacto negativo da doença seja maior quando ocorre no primeiro trimestre da gravidez. No entanto, todas as medidas para evitar a picada do mosquito devem ser mantidas durante toda a gravidez. Além disso, toda grávida deve fazer um pré-natal qualificado, reportando ao seu médico qualquer alteração durante a gravidez – afirma a pediatra e alergista Leticia Nabuco Madeira.
A microcefalia é uma malformação congênita em que o cérebro não se desenvolve adequadamente, explica a médica:
– O bebê nasce com perímetro cefálico menor ou igual a 32 centímetros. O prejuízo ao desenvolvimento neurológico é variável, dependendo da gravidade do acometimento cerebral. É importante a identificação precoce da doença para que o bebê seja inserido no Programa de Estimulação Precoce do Ministério da Saúde, e receba os cuidados especializados a fim de maximizar o potencial de cada criança.
O combate ao mosquito, que também transmite dengue e chikungunya, não é fácil. As condições climáticas do Brasil, associada às mazelas da infraestrutura social são propícias para a proliferação do Aedes aegypti.
– Esse é um assunto bem complexo, pois vivemos num clima tropical e o mosquito se adaptou bem ao nosso ambiente. Mas, apesar de ser muito difícil, podemos pensar num combate mais efetivo ao mosquito, com mudanças de hábitos da população, melhora de coleta de lixo, saneamento básico, condições de moradias e uso de tecnologias que estão aparecendo, como o mosquito geneticamente modificado e outras experiências que estão sendo avaliadas – avalia Teixeira.
Médico sanitarista e ex-ministro de Saúde, José Gomes Temporão também chama a atenção para dificuldade de combater o mosquito.
– A presença do vetor é uma realidade em todo o continente sul americano e em inúmeros países da Europa e América do Norte. As condições climáticas, o aquecimento global facilitam sua propagação. No nosso país, um fator agravante é a precariedade em muitas cidades da infraestrutura de saneamento, oferta de água e coleta de lixo, que, associados, dificultam sobremodo o combate ao vetor. Considerando esse contexto, a ideia de eliminação ou erradicação do vetor é altamente improvável. Mas políticas integradas e intersetoriais podem cumprir um papel importante em reduzir sua presença – diz.
Enquanto a população tenta fazer a sua parte, com todos os cuidados recomendados nas campanhas de conscientização, cientistas buscam uma forma de evitar a doença por meio de vacinas. Mas a imunização ainda vai levar tempo.
– A possibilidade de uma vacina a curto prazo é bastante remota. Existem vários grupos nacionais e internacionais trabalhando em uma futura vacina. Mas, na melhor das hipóteses, essa vacina poderá estar no mercado disponível para uso entre três a cinco anos – explica Temporão.
Ralcyon Teixeira lembra que existe um grupo pesquisando vacinas em conjunto com o Instituto Evandro Chagas e Instituto Butantã, mas que ainda demora alguns anos para o resultado final desse trabalho.
Difícil de evitar e difícil de diagnosticar e de tratar também, pois não existem remédios específicos para as doenças.
– O tratamento é apenas sintomático (tratar da febre, desidratação ou outras complicações que surjam). Em relação a testes laboratoriais rápidos e confiáveis eles existem para dengue. Em relação ao Zika, ainda não temos testes para uso em larga escala e a custos compatíveis. Espera-se que um teste desenvolvido pela Fiocruz possa estar disponível para uso em alguns meses – diz Temporão.
E ainda há muito trabalho pela frente para entender o vírus. O contágio por relação sexual é uma suspeita, mas não há comprovação científica. Sabe-se, no entanto, que nem sempre a pessoa que contrai o vírus da Zika apresenta a manifestação clínica da doença.
– A maior parte das pessoas que entram em contato com o vírus não apresentam nenhum quadro clínico. Nessa situação, uma mulher grávida contaminada pelo vírus, mesmo sem apresentar sintomas, poderá ter seu bebê afetado pelo vírus – diz Temporão.