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Sem leite, e sem culpa

Mulheres que não conseguem amamentar precisam de apoio e não de críticas 

Não é só a alegria que marca os primeiros dias da maternidade. Com o bebê, nasce também a ansiedade, que pode ser muito prejudicial para as mamães. Por mais natural que seja, ter um filho não significa saber ou conseguir fazer tudo de forma prefeita. Aliás, querer a perfeição é o primeiro equívoco e a principal razão do sentimento de culpa que acompanha tantas mulheres. O problema, para muitas, começa durante o período de amamentação. Sim, é recomendado e importante que bebês sejam alimentados exclusivamente pelo leite materno nos primeiros seis meses de vida, mas nem sempre isso é possível. A dificuldade para amamentar pode estar relacionada a diferentes fatores, mas, geralmente, o sentimento de culpa surge da cobrança que as mamães sentem do que é “esperado” pela sociedade.

– Quando pensamos em amamentação durante a gravidez, imaginamos um processo que acontecerá naturalmente, quase que por instinto. Quando o bebê nasce, há muitas tarefas que devem ser aprendidas e percebemos que a amamentação é um comportamento que também é aprendido, apresenta muitos desafios, traz muitas preocupações e ocasiona dores para muitas mulheres. Durante o processo, constantemente, nos perguntamos: será que o bebê mama suficiente? Será que ele está ganhando o peso necessário? E muitas outras dúvidas surgem. A amamentação junto com as inúmeras tarefas acumuladas pela mãe, um sentimento enorme de insegurança com relação aos cuidados do bebê, a falta de uma rede de apoio e muitos outros fatores podem desencadear um processo de estresse. Estes hormônios do estresse são capazes de inibir a ação da prolactina (produção do leite) e da ocitocina (descida do leite). Portanto, muitas mulheres não conseguem amamentar e com isso surge a culpa. Quando nasce uma mãe, nasce a culpa. A sociedade elaborou muitas regras no sentido de como uma mãe deve ser e como deve agir para que seja considerada uma boa mãe, e dentro dessas muitas regras, amamentar, bem como ter parto normal, seriam comportamentos considerados adequados para que você exerça uma boa maternidade. Todos nós somos, muitas vezes, obrigados a enquadrar os nossos comportamentos nas regras sociais. A culpa pode pesar menos na vida de uma mãe se soubermos lidar melhor com as pressões externas, discriminando o que é realmente necessário para nós, aprendendo a lidar com as situações que envolvem pressão – observa a psicóloga Gabriella Gonzales, membro da Sociedade Brasileira de Psicologia.

Cobrança que a economista Tatiana Lyra sentiu de perto quando o filho Eduardo, hoje com 8 anos, nasceu. Além da frustração de não ter conseguido amamentar o menino, tinha que lidar com as críticas e os olhares de reprovação.

– Foi horrível. Eu chorava muito. E o pior de tudo era o julgamento das pessoas. Eu sempre saí muito com ele, e não tinha quem não falasse: “tão pequenininho e já na mamadeira”. Às vezes, eu mentia a idade dele, dizendo que era mais velho. Comentei com  a minha obstetra que estava muito triste, e ela me disse: “você não vai ser menos mãe por causa disso. Não se culpe e não sofra por isso” –  lembra Tatiana.

Hoje, Tatiana percebe que não amamentar o filho não foi o fim do mundo. Ela conseguiu amamentar o caçula, Daniel (6 anos), e não foi menos mãe de Eduardo por isso.  Segundo Gabriella Gonzales, o apoio da família e de amigos, assim como saber valorizar a si própria e encarar com mais leveza os cuidados com o bebê, como aconteceu com Tatiana, ajuda muito a mulher a superar este momento:

– Devemos procurar nos cercar de pessoas que nos apoiam e acreditar que você é a melhor mãe que poderia ser para seu filho, mesmo não cumprindo tudo que a sociedade coloca como necessário para ser considerada uma boa mãe. A melhor coisa para o aprendizado é se divertir, por isso na infância aprendemos tanto, porque nos cobramos pouco. Lembre-se que você está aprendendo a ser mãe tente se divertir no processo, senão a maternidade acaba se resumindo somente nos cuidados com o filho, desencadeando mais estresse.

Lembre-se também que estar cercada por carinho não significa ter que aceitar todo tipo de ajuda.

– É importante salientar que nesse período de tanta sensibilidade temos de procurar exercer nossos direitos de recusar alguns pedidos sem se sentir egoísta, como, por exemplo, pedir para que uma visita se adeque a seus horários. Não se sinta mal de pedir que um visitante vá embora ou não venha até a sua casa porque você está cansada. Mesmo mães de segunda, terceira e mais viagens, têm sensações diferentes com cada filho (a), e têm aprendizados diferentes com cada um (a). Para todas, leve a maternidade como aprendizado constante, não deixando as pressões da sociedade dominar seus pensamentos e se permitindo errar de vez em quando e, principalmente, se perdoando pelos eventuais erros – orienta a psicóloga.

Leia mais: Benefícios e desafios da amamentação , O que é mastite lactacional

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