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De repente adolescente

Pediatra explica mudanças físicas e emocionais da adolescência 

“Como o tempo passa rápido! Ontem mesmo era um bebê!” Se você já pensou ou falou algo do tipo é porque está vendo as crianças em pleno desenvolvimento. E, daqui a pouco, nem serão mais crianças. A partir dos 10 anos, já começam a entrar na adolescência…

– A idade é uma maneira conveniente de definir a adolescência, porém esta deve ser vista apenas como um dos parâmetros para delinear essa etapa da vida. Conforme a Organização Mundial de Saúde (OMS), adolescência compreende o período de vida entre 10 anos a 20 anos incompletos, caracterizado por importantes transformações físicas – crescimento como um todo e surgimento da puberdade, evidenciada pelos caracteres sexuais secundários – reorganização psíquica, peculiaridades afetivo-sexuais, comportamentais, socioculturais, espirituais, com busca de projetos de vida e outra percepção do mundo. Já o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), considera criança até 12 anos incompletos e adolescente dos 12 aos 18 anos incompletos – explica a Alda Elizabeth Iglesias Azevedo, presidente do Departamento de Adolescência da Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP).

As mudanças não ficam restritas ao corpo. O comportamento costuma mudar, e isso não tem nada de anormal, nem de rebeldia sem causa. Há mudanças intensas também nas emoções, na forma de lidar com o mundo.

– A OMS define adolescência como um período da vida com necessidades específicas em relação à saúde e ao desenvolvimento, pois se trata de um momento de aquisição de conhecimento e habilidades, gerenciamento de emoções e ampliação dos relacionamentos sociais. Todas essas aquisições serão importantes para que no futuro o adolescente possa assumir papéis adequados na vida adulta. O período entre ser criança e ser adulto é reconhecido por todas as sociedades, porém a forma como esta transição é caracterizada difere entre as culturas e também ao longo do tempo. Dentro desta faixa etária torna-se necessário avaliar e comparar as mudanças biológicas – como a puberdade, assim como levar em conta as transições sociais. Cabe ressaltar ainda que o período da adolescência é um período dinâmico, pois ocorrem alterações e desenvolvimento, que ligados às mudanças hormonais, levam os aspectos psicossociais e emocionais a passarem por adequações, assim como a capacidade cognitiva e intelectual passam a ser mais fortes, contribuindo para o pensamento lógico, moral e crítico – diz a médica.

Os aspectos culturais também influenciam muito no comportamento dos adolescentes, lembra Alda Elizabeth:

– As mudanças que ocorrem no ambiente onde o adolescente está inserido afetam e são afetadas pelas mudanças internas da adolescência. As influências externas, que são diferentes entre as culturas e sociedades, apresentam valores, normas e condutas esperadas dos adolescentes, assim como o surgimento de novos papéis sociais e responsabilidades e expectativas do próximo período de vida. Essas influências têm peso considerável no desenvolvimento psicológico na adolescência.

As diferenças sociais, no entanto, dificilmente vão retirar da adolescência características muito marcantes desta fase da vida. Estudos mostram que adolescentes não conseguem manter uma linha de conduta rígida, permanente e absoluta.

– A adolescência é um período de contradições, confuso, ambivalente, doloroso, caracterizado por fricções no meio familiar e social, e por conta desse quadro é frequentemente confundido com crise e estado patológico. Isto significa que o adolescente flutua entre dependência e independência extremas, pois varia entre o impulso de desprendimento e a defesa imposta pelo temor da perda do conhecido. Nesse período, o adolescente resgata defesas mais primitivas, de acordo com o indivíduo e suas circunstancias, o que denominam de “patologia normal” do adolescente, uma vez que o mesmo exterioriza seus conflitos de acordo com sua estrutura e experiências. Por isso, torna-se necessário o conhecimento de alguns aspectos psicodinâmicos da adolescência – explica a médica.

E você, pai ou mãe, sabe bem o que é não se sentir nem lá (na infância) nem cá (na vida adulta). Lembrar disso é muito importante para lidar com o momento dos filhos.

– As incontroláveis modificações corporais e os imperativos do mundo externo exigem do adolescente novos padrões de convivência que, a princípio, são vividos como uma invasão. Isso os leva a manter os desejos infantis como defesa, mas que também convivem com o prazer e ânsia por alcançar um novo status. O adolescente também é conduzido a um refúgio em seu mundo interno para que possa se reconectar com seu passado e, a partir dali, enfrentar o futuro. Essas mudanças, nas quais perde sua identidade de criança, implicam na busca de uma nova identidade que vai se construindo no plano consciente e inconsciente – afirma Alda Elizabeth.

O que muda mesmo entre as gerações, e acaba afetando a forma de o adolescente interagir com o mundo, são as transformações sociais. Hoje, a exposição a tantas informações e o uso de redes sociais fazem diferença.

– A rapidez com que a tecnologia virtual evoluiu – assim como o crescimento desordenado das redes sociais e a comunicação interligada globalmente – resultou em um fenômeno clínico e psicológico que atinge principalmente crianças e adolescentes do mundo atual, conhecidos como geração “D” (digital), que apresentam como resultado transtornos de ansiedade e fobias sociais, entre outros sintomas. Esses fatores implicam em aumento do número de horas gastos em frente às telas (smartphones, tablets, jogos eletrônicos), contribuindo também para o aumento da obesidade mundial e surgimento precoce de diversas outras doenças que, anteriormente, acometiam apenas os adultos – avalia a médica.

E como essa tecnologia tende a ser cada vez mais parte do nosso cotidiano, não adianta proibir o acesso. Importante é estimular hábitos mais benéficos para a saúde, como a prática de esportes.

– A prática regular de exercício físico deve ser recomendada o mais precoce possível tendo em vista os inúmeros benefícios, a curto e longo prazo, para a saúde e qualidade de vida do indivíduo, em todas as faixas etárias, fato esse bem documentado na literatura científica. Quando falamos em adolescentes, especificamente, há evidências, também, que o exercício físico traz benefícios aliados à saúde esquelética (conteúdo e densidade mineral óssea), além do controle da pressão arterial e do excesso de peso, assim como auxilia no controle dos níveis glicêmicos, otimizando os níveis de HDL colesterol, reduzindo níveis de LDL colesterol, além de ter papel na socialização e na melhora de autoestima destes adolescentes. Estudos também mostram que, quando iniciada na infância ou adolescência a prática de exercícios físicos torna-se mais estável na vida adulta e, portanto, mais difícil de ser suprimida. Entretanto, especialmente, quando o foco é o adolescente, a prática de exercícios físicos não é isenta de riscos, pois estamos frente a um indivíduo em rápida transformação biopsicossocial, de tal forma, que a avaliação da fase de desenvolvimento em que se encontra, bem como a identificação de fatores de risco, pessoal ou familiar, para a ocorrência de agravos cardiovasculares e morte súbita é fundamental para que tenhamos o máximo de benefícios do exercício físico – recomenda a pediatra.

E como o assunto é saúde, vale lembrar que adolescentes podem e devem procurar pediatras. Costumam ficar envergonhados, pois não são mais crianças. A especialidade médica, no entanto, tem como abrangência o atendimento da criança (0 a nove anos) e do adolescente (10 anos de idade a 20 anos incompletos).

– Atender adolescentes demanda postura ética e conhecimento específico frente a situações de comportamentos específicos e que também envolvem a família, havendo premência em identificar fatores de risco e protetores, no sentido de oferecer promoção e prevenção adequadas à saúde – destaca Alda Elizabeth.

Há, ainda, o direito dos adolescentes ao atendimento em toda a rede de saúde, sem discriminação em razão de alguma deficiência física, mental, sorológica (HIV/AIDS) ou por classe social, etnia/cor, orientação sexual, identidade de gênero e estilo de vida. Isso vale em consultórios, nas unidades de saúde, ambulatórios, por equipes da saúde da família, serviços de emergência ou pronto-atendimentos, hospitais e laboratórios de análises clínicas e de imagens.

– Os adolescentes têm o direito de receber informações sobre qualquer aspecto relacionado com sua sexualidade e saúde reprodutiva. Orientados por profissionais de saúde, inclusive o pediatra, podem e devem decidir pela escolha de métodos contraceptivos adequados para essa fase, para o exercício de uma vida sexual saudável e responsável: preservativos masculino e feminino, anticoncepcionais hormonais orais, anticoncepcional injetável, diafragma, DIU e, se necessária, a contracepção de emergência. Acesso aos serviços de saúde em geral: sozinho/a ou acompanhado/a. Os adolescentes têm direito à escolha de realizar consulta médica, procedimentos não invasivos como coleta de exames laboratoriais, sozinhos ou acompanhados por familiares, amigos ou parceiros, desde que o profissional reconheça que ele tem discernimento adequado de sua saúde e compreensão de seu autocuidado. Este atendimento vem se revelando como elemento indispensável para a melhoria do acesso aos serviços, da qualidade da prevenção, assistência e promoção de sua saúde. Toda e qualquer exigência, como a obrigatoriedade da presença de um responsável para acompanhamento no serviço de saúde, constitui lesão ao direito maior de uma vida saudável. Os adolescentes também têm direito à vacinação pelo Programa Nacional de Imunização.

 

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