A tradutora e biblioterapeuta Claudia Tozzini Barretto aborda a importância da atenção necessária a crianças com altas habilidades no livro “Ele é superdotado, e daí?”. A obra traz um pouco da história da própria autora, que tem um filho com altas habilidades, e ajuda famílias e professores a entenderem melhor a condição.
Por meio de muitas pesquisas sobre o assunto, Claudia destaca algumas das várias características que pessoas com altas habilidades podem apresentar.
Aptidão acadêmica específica: alta concentração, rapidez de aprendizagem, boa memória e motivação por disciplinas acadêmicas do seu interesse, além da capacidade de produção acadêmica;
Pensamento produtivo ou criativo: originalidade de pensamento, imaginação, capacidade de resolver problemas de forma diferente e inovadora.
Talento especial para artes: alto desempenho em artes plásticas, musicais, dramáticas, literárias ou cênicas;
Capacidade psicomotora: desempenho superior em velocidade, agilidade de movimentos, força, resistência, controle e coordenação motora.
Veja, na entrevista da autora ao Quem Coruja, suas preocupações em relação ao diagnóstico de altas habilidades e ao papel das instituições de ensino no desenvolvimento adequado das crianças nesta condição.
Quem Coruja – A locução “E daí?” é comumente usada para expressar certa indiferença. Qual o significado dela no contexto do livro que fala sobre superdotação?
Claudia Tozzini Barretto – Muito interessante esse questionamento. Foi exatamente essa indiferença que quis trazer para os leitores, ou seja, o descaso vivido nas escolas pelas quais meu filho passou. O fato de ser uma criança superdotada, com muita espontaneidade e criatividade, não o livrou de ser negativamente rotulado pelas escolas. Houve sofrimento com tanta falta de consideração. Com isso, tento mostrar no livro que, mesmo sendo superdotado, sua vida escolar não foi nada fácil (como muitos possam imaginar que tenha sido). Mas e então? E daí? Com o livro, eu convido os leitores a fazer essa reflexão e pensar a respeito do nosso atual sistema de ensino, o qual desperdiça talentos ao não considerar a forma diferenciada de aprendizagem das crianças e jovens superdotados.
Quem Coruja – O livro é uma espécie de guia para as famílias? Qual o principal objetivo da obra?
Claudia Tozzini Barretto – Não diria que é uma espécie de guia. Trago, inicialmente, uma parte biográfica para contar um pouco da nossa história e, depois, sigo com a contextualização da temática sobre Superdotação. Achei importante oferecer também aos leitores todo o conhecimento prático de tudo aquilo que havia exposto. Meu objetivo foi mostrar ao público a minha indignação, foi um tipo de desabafo. E aí vejo que os pais que passaram pelas mesmas dificuldades pelas quais passamos são os que mais se interessam pelo livro. Quis ampliar a divulgação da temática, ao mesmo tempo em que pude contribuir para o despertar de um novo olhar para a forma diferente de aprendizagem das crianças superdotadas. É por meio da disseminação do conhecimento que podemos promover mudanças necessárias para a melhoria da educação e também para a qualidade de vida no âmbito familiar.
Quem Coruja – Crianças com altas habilidades costumam sofrer preconceito?
Claudia Tozzini Barretto – Normalmente, as crianças e jovens com altas habilidades sofrem o preconceito que muitas pessoas têm ao achar que não precisam de ajuda e de atenção especial, pois como são inteligentes, conseguem “se virar” sozinhos. Isso não é verdade. Essas crianças precisam, sim, de suporte. Elas não são atendidas em suas especificidades. O maior preconceito é enfrentado nas escolas, pois os profissionais, em sua grande maioria, não sabem lidar com alunos com essa condição. Enquanto isso, há muito sofrimento, não só dos alunos, mas também de suas famílias. E por desconhecerem o assunto, os profissionais dessas escolas acabam rotulando as crianças até mesmo com patologias inexistentes. A identificação não é para rotular, mas sim para ajudar na busca de uma ação pedagógica adequada de acordo com as necessidades educacionais, sociais e
emocionais de cada indivíduo superdotado.
Quem Coruja – Como a senhora avalia a questão do diagnóstico? Quais os maiores prejuízos da demora na identificação das altas habilidades?
Claudia Tozzini Barretto – Creio que a identificação da superdotação/altas
habilidades é de suma importância para crianças e jovens. Até mesmo para os adultos, pois acabam se beneficiando e tendo uma melhor qualidade de vida. As pessoas se reconhecem em suas singularidades e podem melhorar consideravelmente suas vidas. Todos passam a entender melhor a forma como agem e reagem a diversos estímulos. No caso das crianças, a família desempenha um papel primordial nesse processo, uma vez que, compreendendo sua condição, poderão ajudá-las em seu desenvolvimento geral e também acolhê-las emocionalmente. E a demora na identificação causa prejuízos muitas vezes traumáticos para essas crianças. Infelizmente, a superdotação não é vista e nem reconhecida no ambiente escolar. Acredito mesmo que haja falta de preparo dos profissionais. Ainda é um assunto invisível. Seria mais adequado, em primeiro lugar, que as escolas buscassem se aprimorar, que seus profissionais fossem devidamente capacitados para lidar com essas crianças e jovens. Esse já seria um grande passo para melhorar essa situação e ajudar tantas pessoas invisibilizadas em sua condição.