Psicóloga destaca a importância do apoio aos cuidadores
O interesse pelos processos de desenvolvimento da primeira infância, a experiência como professora de Educação Infantil e a paixão pela psicologia levaram Heloisa Coutinho a estudar e se aprofundar nas relações das crianças com seus cuidadores. Pais, avós, educadores, babás, todos têm importância e responsabilidades na formação, sobretudo afetiva, das crianças. O isolamento necessário por conta da pandemia de Covi-19 fez com que a psicóloga, que é especialista em Saúde Mental da Infância e Adolescência, olhasse com ainda mais atenção para esses cuidadores, em especial, casais grávidos. Em março, logo no início do isolamento, Heloisa deu início à Roda de Conversa e Mindfulness para Grávidas, na qual acompanha algumas gestantes e puérperas. Ao Quem Coruja, ela fala sobre esse trabalho e os desafios da parentalidade neste cenário imposto pelo novo coronavírus:
– Como psicóloga, sempre tive um olhar muito atento e sensível para os cuidadores da primeira infância, por entender a importância fundamental dos primeiros anos de vida de uma criança, do atendimento às suas necessidades essenciais e da construção de vínculos afetivos seguros. Se, por um lado, queria proteger a primeira infância oferecendo essa rede de cuidado atenta e sensível, por outro lado os estudos, meu lado curioso e observador e as trocas com profissionais inspiradores apontavam para a ideia de que cuidar dos cuidadores também se fazia necessário. Ser mãe e ser pai são tarefas que exigem muito, o exercício da parentalidade não termina nunca.
Apesar de haver muito de instinto no que se refere a cuidados e proteção na relação entre pais e filhos, ninguém nasce sabendo ser pai e mãe, destaca a psicóloga.
– Há muito também a aprender. Além de que cada pessoa é um universo único e todos carregamos conosco as crianças que fomos um dia. Estas nossas crianças carregam consigo as boas lembranças, a memória de suas descobertas, de suas competências e de suas aquisições. Mas também levamos junto aqueles momentos em que não fomos atendidos, onde existiram dores e incômodos. E, junto a uma criança com quem passamos a ter uma interação, mesmo que de cuidado, nossas memórias se apresentam nos ajudando, nos questionando e, até mesmo, nos mobilizando. Assim, vi a importância de oferecer aos cuidadores de crianças,especialmente das pequenas, um espaço de trabalho. Cuidar e apoiar os cuidadores da primeira infância é fundamental, além de ajudá-los e acompanhá-los no exercício de sua parentalidade, é uma forma indireta de cuidar das crianças – as nossas, internas, e aquelas com quem interagimos e nos comunicamos no dia-a-dia – explica Heloisa.
A pandemia tem afetado de várias formas as relações pessoais, impondo uma série de restrições, o que afeta, diretamente, as famílias à espera de um neném.
– Já atendi gestantes e fiz grupos de gestantes em muitos outros momentos; me parece que assim como acontece às gestantes em todas as outras épocas, as mulheres que estão grávidas durante a pandemia estão mais recolhidas.As conhecidas questões psíquicas ligadas à gestação e ao parto permanecem, mas alguns aspectos ligados a esse momento particular chamaram mais a minha atenção: medo de contrair a doença ao longo da gestação ou do parto, medo do bebê contrair a doença no parto, insegurança quanto ao momento do parto acontecer sem a presença do companheiro (a) ou outra pessoa da rede de apoio. Pelas falas das gestantes, me parece que a falta de rede de apoio após o parto parece ter impacto maior. Tradicionalmente os pais recebem cuidado e atenção de seus pais, o que facilita sua dedicação ao recém-nascido. Por outro lado, a impossibilidade de realização de alguns ritos como não poder apresentar o bebê ao mundo e não receber visitas também é uma fala nova e parece trazer uma sensação maior de tristeza. Daí a importância do texto Aos Casais Grávidos. Vai Passar! Além de validar as angústias e preocupações dos casais, o texto fala dos aspectos positivos da gestação, da força da vida sendo gerada e oferece sugestões como ponto de partida para que cada casal encontre seu próprio modelo de forma a se sentir acolhido e apoiado, cercado por suas referências familiares, além de sugerir maneiras para “apresentar seu bebê ao mundo” – avalia a psicóloga.
Tão importante quanto à maternidade é a paternidade, e o trabalho de Heloisa Coutinho sempre valorizou o papel do pai. Papel que também precisa receber atenção neste momento.
– Parentalidade envolve maternalidade e paternalidade. Assim como as mulheres, os homens vivem as suas gestações, atualizam questões emocionais, reorganizam sua identidade, habilitam-se a tornarem-se pais. Cada vez mais encontramos estudos e pesquisas nesta área que confirmam um processo especial do homem quando sua companheira se encontra gestando um bebê. No meu percurso profissional sempre tive o cuidado de acolhere acompanhar os pais. Minha monografia de graduação, fruto de uma pesquisa com pais, teve como tema “O pai na UTI Neonatal”. Apresentei esse trabalho em vários congressos e o texto virou artigo científico. De modo geral, vejo os homens mais engajados, presentes e participativos,vivendo as suas gestações e inquietações, cuidando de suas companheiras, construindo uma relação com seus bebês ainda intra útero. Sua participação no parto, entendida como um apoio à mulher, mas especialmente sendo um marco para seu processo de parentalidade tem sido mais facilitada pelas equipes de saúde e respeitada pelas famílias. Após o nascimento a presença deles se faz ainda mais necessária. São os dois, pai e mãe, que juntos vão cuidar do bebê e cuidar um do outro, sustentados em suas tarefas pela rede de apoio formada pela família e por seu grupo social- destaca.
Foto em destaque: Imagem de BRUNA BRUNA por Pixabay