Psicóloga perinatal destaca a importância do luto
O Quem Coruja é um cantinho de carinho, com a intenção de trazer sempre informações para o bem-estar de gestantes e crianças. Por isso, mesmo sendo triste tocar no assunto, também é preciso falar de morte, da dor da perda e da importância do luto, pois, infelizmente, isso afeta muitas famílias.
A dor pela perda de um filho é indizível… e não é menor quando acontece ainda na vida intrauterina.
– Nossas taxas de mortalidade fetal (consideradas as gestações a partir da 22ª semana ou cujos bebês apresentam mais do que 500g) giram em torno de uma para cada cem nascidos vivos. O número pode não parecer grande a primeira vista, mas é, sim, se pensarmos que para aquela família sua perda será irreparável. As perdas anteriores as 22 semanas não são consideradas nas estatísticas, pois são consideradas como abortos espontâneos. Essas perdas são mais frequentes e difíceis de notificação, então não sabemos ao certo, mas podemos estimar que são bastante frequentes. Essa é uma classificação comumente utilizada, mas sabemos que o amor pelo filho e o trabalho interno que é convocado diante de uma perda, não pode ser medido por semanas de gestação. Por isso sabemos que uma perda será tão dolorosa quanto seus pais já estiverem vinculados ao filho, não importa quantos dias da concepção – explica Helena Aguiar, psicóloga perinatal, especialista em psicoterapia na infância e adolescência da Perinatal.
Luto deve ser respeitado mesmo quando se trata de aborto espontâneo
Eu entendo perfeitamente. Sofri três abortos espontâneos antes de dar à luz meus filhos. Foram momentos muito difíceis para mim. Superei os sofrimentos, mas levei um bom tempo para saber lidar com cada perda.
– A perda perinatal (morte durante a gestação, parto ou puerpério) traz especificidades que podem dificultar ainda mais o já tão doloroso processo de luto dos pais. Quando o bebê não nasce vivo ou vive pouco tempo, ele não tem uma existência compartilhada e é comum que o entorno (família e amigos) procure diminuir a intensidade dessa perda, como se não tratasse da perda de um filho, como se fosse algo a ser “superado”. Frases como “vocês poderão ter outros filhos”; “Foi melhor assim, poderia ter problemas maiores…” mostram essa tendência. Isso traz um sofrimento adicional e pode trazer um isolamento aos pais que sofreram a perda. Algumas vezes pessoas próximas se desfazem dos pertences do bebê e não deixam os pais decidirem sobre o que fazer com as evidências de que ali deveria ter um bebê. Isso também é danoso, pois paira uma sensação de irrealidade, como se tudo fosse abstrato, como um sonho. A falta de contato com a realidade da perda, dificulta a entrada no trabalho de luto – alerta Helena, destacando a importância de respeitar o luto. – É muito importante reconhecer essa perda. Eles precisam falar sobre ela, viver essa experiência como de fato ela é. Os pais precisam entrar em contato com essa dor dilacerante, para depois iniciarem esse árduo trabalho de tentar elaborar essa ausência, elaborar o luto de tudo que eles imaginaram para esse bebê que gestaram. Quando os pais perdem seu bebê nesse início, eles precisam enterrar uma parte de si mesmo, pois o bebê nessa fase é muito dos pais, dos seus sonhos e desejos projetados na promessa do bebê.
Apoio e atenção ajudam no processo de luto
A rede de apoio, tão necessária para as mamães quando os bebês nascem, também faz muita diferença nos casos de perdas. Muitas vezes, basta um colo, um ombro amigo, palavras e gestos de carinho. Em alguns casos, atenção para sinais que merecem mais cuidados.
– O que se deve atentar é que, durante a fase mais aguda deste processo de luto, o enlutado pode se descuidar muito da saúde e até apresentar comportamento de risco à sua integridade. Por isso, é muito importante que a rede de apoio esteja presente, dando um suporte e procurando estar atento a sinais preocupantes, como Insônia recorrente, comportamentos auto-agressivos, ideação suicida, negligência acentuada com hábitos de higiene ou alimentação – diz psicóloga.
O mais importante é respeitar o tempo e a maneira que cada pessoa vivencia o luto. Costuma-se associar o luto às fases de negação, raiva, barganha, depressão e aceitação, propostas pela psiquiatra Elisabeth Kubler-Ross, que se debruçou sobre o assunto e escreveu vários livros a respeito do tema. Segundo Helena Aguiar, o modelo baseia-se em comportamentos e sentimentos recorrentes em pessoas enlutadas, mas não consiste em uma regra:
– Sabemos hoje que o processo de luto não é linear. Justamente pela singularidade de cada pessoa diante de cada perda, sempre particular. Mas é frequente que apresentem essas reações, não como fases que são superadas, mas como momentos vividos. Alguns experimentam todas essas reações, outras só algumas. Às vezes, esses sentimentos vão e voltam.
Por mais que seja triste, doloroso, espinhoso, é importante tentar entender um pouco sobre o luto. Se a dúvida é como ajudar uma criança a lidar com a situação, leia também “Luto na infância“.
Foto em destaque: Imagem de Anemone123 por Pixabay