Escritor indígena, Daniel Munduruku tem vasta produção para crianças
Na semana em que celebramos o Dia Nacional do Livro Infantil (18/4) e o Dia do Índio (19/4), o escritor Daniel Munduruku fala sobre como utiliza a literatura para desconstruir a imagem estereotipada dos indígenas e contar histórias cheias de referências à cultura dos povos e etnias para crianças.
Daniel é indígena da etnia Munduruku, filósofo, doutor em Educação e pós-doutor em Literatura. Já publicou 50 livros, muitos dos títulos voltados para o púbico infantil. É a própria infância do autor, vivida em sua aldeia, que inspira essa produção literária.
– Estou sempre falando de minha memória de infância. Às vezes consigo falar de como eu cresci dentro de uma aldeia. Outras vezes falo das histórias de outros povos procurando fazer paralelos com a vida das crianças das cidades. Meu intuito é sempre mostrar que há várias maneiras de sermos humanos e que nenhuma é melhor ou superior a outras. Há muito o que ser dito ainda e neste processo há muitos outros autores e autoras que estão surgindo com muita força por todo o Brasil – explica o autor.
Para Daniel Munduruku, a literatura é um meio expressar e difundir a cultura indígena, além de uma oportunidade de corrigir muitas distorções que influenciaram várias gerações.
– Eu escrevo para as crianças urbanas. Não tenho e nunca tive a pretensão de escrever para os meus parentes indígenas. Sou educador de formação e isso me levou a optar por escrever para crianças com o objetivo de auxiliar na desconstrução desse olhar romantizado que nos impuseram. Descobri, na literatura, um ótimo instrumento para alcançar meu objetivo. Através dela eu posso envolver as crianças na magia de nossas histórias, nos mistérios que envolvem nossa existência, nas nossas lutas sociais pela sobrevivência. Ou seja, a literatura me proporciona a possibilidade de anunciar nossas histórias e denunciar os conflitos que nos cercam. O desafio é sempre como transformar temas tão difíceis em literatura e que permitam que as crianças eduquem seu pensamento sem que isso pareça um discurso de vingança. Penso que minha literatura é para formar gente e gente precisa ser alimentada com boas histórias – avalia.
À criatividade do autor junta-se a responsabilidade do educador, e em seu trabalho Daniel Munduruku busca mostrar o que, muitas vezes, não aparece na literatura nacional.
– Quando penso a literatura brasileira vejo que a presença indígena é apresentada de forma equivocada, reproduzindo estereótipos e imagens de um passado colonialista. Isso não é tanto culpa dos escritores, mas da história oficial como nos foi apresentada durante nossa formação escolar. A maioria dos escritores são vítimas de uma educação que sempre priorizou o estereótipo e as ideias preconcebidas que apresentavam o indígena com o olhar romântico ou ideológico. Nessa forma de enxergar, nossa gente sempre foi colocada como atrasada, selvagem, sem história, presos de um passado memorial. Os livros eram escritos a partir desse imaginário que sempre afastou os indígenas da contemporaneidade. Hoje isso tem melhorado, mas ainda não com a intensidade necessária para reverter o preconceito pelo qual passam os povos tradicionais do Brasil – afirma.
Foto em destaque: livro Kabá Darebu, uma das obras de Daniel Munduruku